domingo, 11 de março de 2018

Era o que faltava!

Na apaixonada controvérsia (muito política e pouco académica) suscitada pela contratação do ex-primeiro ministro Passos Coelho para lecionar numa das escolas da Universidade de Lisboa como "professor convidado" - o que tem pleno cabimento legal -, alguém publicou no twitter a seguinte afirmação:
«Se a maioria dos alunos do ISCSP decidir que não quer Passos como professor, a direcção do Instituto só tem de acatar a decisão.»
E eu que julgava que os professores são recrutados pelos órgãos estatuários competentes das universidades, e não por via de referendo dos alunos. Pelos vistos, há quem proponha o regresso à autogestão estudantil de maio de 1968, há 50 anos. Mas os estudantes são utentes, não os donos, das universidades!
Para privilégio estudantil já basta beneficiarem de um serviço público que em grande parte não pagam e participarem no governo das suas instituições...

Adenda
Julgo que numa escola superior de ciências políticas e de políticas públicas faz todo o sentido ter o contributo do "saber de experiência feito" de decisores políticos qualificados, como um ex-chefe do Governo e ex-líder partidário, tal como pode ser importante a experiência de empresários ou de gestores qualificados em escolas de economia ou de gestão, por exemplo. É para isso que serve a figura de professor convidado, que dispensa justamente as qualificações e o currículo académico. É certo que se pode dizer que a lei exige a um professor catedrático tarefas que um convidado externo não está em condições de desempenhar (como as de coordenação académica e científica); mas parece razoável entender que a norma em causa deve ser objeto de uma interpretação restritiva quanto ao seu âmbito, de modo a incluir somente os catedráticos de carreira, excluindo os convidados. Não é esse obviamente o seu papel, pelo que não pode ser esse o entendimento da lei.

Adenda 2
Devo acrescentar que, a meu ver, a participação direta na vida política pode ser vantajosa mesmo para os académicos de carreira. Invocando a minha própria experiência pessoal, não tenho dúvidas em dizer que o meu ensino de direito constitucional, de ciência política e de direito da União Europeia seria sem dúvida mais pobre, se não tivesse sido, como fui, deputado à Assembleia Constituinte, à Assembleia da República e ao Parlamento Europeu. O saber não se adquire só nas bibliotecas universitárias.